Wednesday, November 08, 2006

E no fim

De corpo leve e alma lavada percorreu o pouco caminho que já faltava para a Madalena, tinha agora à sua frente o portal neo-manuelino, convidativo ao cumprimento de uma velha promessa que fizera e que o tempo, que vai da juventude à maturidade, deixou esquecer. Não interessava já que fosse uma promessa a Cibeles, era agora a Maria Madalena que ele se curvava, a talha a que Machado de Castro imprimira devoção era a acha que precisava para reacender o peito feito cinzas.
Ajoelhou-se, compreendeu a humildade, a entrega, a súlplica, todos os homens e mulheres, de talha, feitos santos, adquiriram a vida de um tempo cuja naturalidade era interior e não reflexo de uma marca. Entregou-se e para consumar a promessa...

Tocou o despertador. Sofia, ainda envolta no perfume onírico da noite deslizou a mão e parou a melodia que Franz Peter desenvolvia canoramente num lieder. Sentou-se na cama, ainda de luz apagada, toda a história de uma parte de vida passou-lhe numa noite, que estranho era viver a pele de outrém, provavelmente efeitos de uma má digestão. Acendeu a luz, fez combinações de roupa durante quinze indecisos minutos e após um conforto de colar certo partiu para o duche. Pensava no dia de trabalho que tinha pela frente, o sonho ia-se desvanecendo, onde ia tomar café à noite, o sonho ia-se esquecendo, e por fim que dormiria novamente para um fim-de-semana de tanta-coisa-a-fazer.
Algures alguém cumpriu uma promessa, quem viveu e quem sonhou? Sofia nunca pensou nisso e num bom toque de perfume a mais vaga recordação foi-se como uma maré que fugiu.

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